2 de outubro de 2008

noite onde a mais bela aventura


Foto de Alberto Guimarães

O registo digital desta foto marca as 18.12 de ontem, quando no interior das cercas metálicas de S. Lázaro já poucas pessoas persistiam em estar.
Entende-se que o Jardim de S. Lázaro feche cedo. Não por questões de segurança mas porque o jardim tem de encerrar quando os pássaros se calam. O que ali se viveu durante o dia será enxugado enquanto o sol se põe. Começara então a sessão da noite que, em panavision ou não, será de um filme fantástico, impenetrável para o comum dos mortais. Depois, de manhã o jardim, abrirá as portas de novo com um filme para todos.
Mas estas conjecturas não estavam previstas. A minha intenção era, com esta fotografia, novamente colar num post da Galena palavras de Eugénio de Andrade.

VEGETAL E SÒ

É outono, desprende-te de mim.

Solta-me os cabelos, potros indomáveis
sem nenhuma melancolia,
sem encontros marcados,
sem cartas a responder.

Deixa-me o braço direito,
o mais ardente dos meus braços,
o mais azul,
o mais feito para voar.

Devolve-me o meu rosto antigo,
sem lágrimas sepultadas nos lábios,
sem nenhuma criança acordada
nas pálpebras pesadas.

Deixa-me só, vegetal e só,
correndo como um rio de folhas
para a noite onde a mais bela aventura
se escreve exactamente sem nenhuma letra.

Eugénio de Andrade

1 comentário:

Cristina Loureiro dos Santos disse...

Lindo!

Abraço.

Cristina Loureiro dos Santos